sexta-feira, outubro 10, 2014

ENTRE RATOS E ELEFANTES

A democracia se consolida pela livre escolha dos governantes. No afã de entender melhor os meandros da política, momentos como os das eleições transbordam para sentimentos de mudanças a qualquer preço. Mudanças do que e que apontam para onde?

De repente, ao reler uma fábula antiga, surge uma iluminação.

A fábula

“Havia num país distante um rei que amava queijos acima de quaisquer outros prazeres. Amava-os tanto que mandou vir para o reino os mais renomados especialistas do mundo, não só para garantir a fabricação dos queijos já conhecidos, mas também para pesquisar novos sabores. As universidades tornaram-se centros de pesquisa de queijos. Ficaram famosos queijos feitos com leite de baleia e leite de unicórnio. O palácio do rei tornou-se um enorme depósito de queijos de todo tipo e sabor. O cheiro atravessava os mares.

O reinado ficou famoso e enriqueceu com a produção e exportação de queijos. No campo da teologia, estudos comprovaram que o sacramento da eucaristia não foi celebrado com pão e vinho, mas com queijo e vinho.

Aconteceu, entretanto, que, além do rei e do povo, outros seres que gostavam de queijo se mudaram para o palácio: OS RATOS. Atraídos pelo cheiro, milhares de ratos passaram a se deliciar dos queijos reais. Todo dia os ratos se multiplicavam aos milhares e invadiam armários, gavetas, sofás, cozinhas, até mesmo o trono real.

O pior. De alguma forma, os ratos tinham que expelir a comilança. Pequenos cocozinhos, durinhos e mal cheirosos se espalhavam por todo o palácio.

Furioso com o cheiro insuportável do excremento , o rei chamou seus ministros e perguntou-lhes como fazer para se livrar dos ratos. É fácil, majestade. Basta trazer os gatos”, responderam.

Felicíssimo, o rei mandou providenciar uma centena de gatos para acabar com os ratos. Ao verem os gatos, os ratos fugiram em polvorosa. Foram-se os ratos, ficaram os gatos.

Tal qual os ratos, os gatos comiam tudo o que viam pela frente e movidos pelas mesmas necessidades fisiológicas, cobriam o brilhante piso do palácio de cocô.

Foribundo, o rei chamou os ministros e perguntou-lhes como acabar com os gatos. “É fácil, majestade. Basta trazer os cachorros”, responderam.

Foram-se os gatos e cachorros de todas as raças e tamanho foram morar no palácio. Comilões, os cachorros começaram a fazer cocô no leito real, coce no tapete persa e xixi nas begônias do vasto jardim. Ao final, havia cocô de cachorro e cheiro insuportável de xixi em todos os cantos do palácio.

Apavorado com a imundície provocada pelos caninos, o rei chamou seus ministros e perguntou-lhes como fazer para se livrar dos cachorros. “É fácil, majestade. Basta trazer os leões”, responderam.

Assim se fez. Chegaram os leões com suas jubas exuberantes. A cachorrada, ao ver chegar os leões, fugiram em debandada. Foram-se os cachorros, ficaram os leões.

Mas os leões, não só comiam cem vezes mais, como defecavam cem vezes mais.

O reino entrou em crise. Faltava dinheiro para pagar a carne que alimentava os leões e os catadores de cocô ameaçavam entrar em greve.

Desesperado,, o rei chamou seus ministros e perguntou-lhes como fazer para se livrar dos leões. “É fácil, majestade. Basta trazer os elefantes”, responderam.

Foram-se os leões e ficaram os elefantes. Grandões, eles comiam montanhas e defecavam montanhas.

Deprimido, o rei chamou os seus ministros e perguntou com voz sumida: “Que fazer para nos livrarmos dos elefantes?

Eureka. Os ministros lembraram que os elefantes, corajosos por natureza, estremecem ao ver um rato. E responderam em coro; “É fácil, majestade. Basta trazer os ratos”.

Então foram-se os elefantes e os habitantes do reino passaram a viver felizes com os ratos e seu miúdo cocô.”

Em visita ao Congresso Nacional, símbolo da democracia, você notará espantado que os prédios estão cheio de ratos e você exclamará: “Deve haver muitos ratos por aqui!”

Sim, existem muitos ratos.

E você perguntará: “Por que não trazem os gatos para acabar com os ratos.”

E a história de novo deverá ser contada para mostrar a grande lição da democracia. “Se para o bem da nação, é preferível manter o cocô de rato que mudar ao de elefante.”

Inspiração: Crônica “O rato roeu o queijo do rei ..". de Rubem Alves

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