Um domingo de janeiro curitibano, meio frio por excelência, sugere algumas
reminiscências. A viagem acontece lá pela segunda metade da década de 70,
começo dos anos 80. Curitiba suja, louca
e desvairada. Frio, muito frio sempre. A poesia aquecia o coração os boêmios
irreverentes. A fumaça dos bares denunciava a quantidade de Carlton, Minister devorados
naquelas madrugadas compridas.
A via sacra começava na Velha Adega, local pequeno de dois
ambientes, na Cruz Machado. A garçonete
histórica – pena não lembrar o nome – sempre com um indefectível avental , magra e de rosto pálido, séria.
Atendia os loucos com a cara amarrada e todos a respeitavam, gostavam dela. Pub lotado. Vez ou outra o violão saía do
canto da parede e um dedilhado tentava acompanhar o som dezenas de vozes inspiradas em
Zé Ramalho ou Elis.
Perto da meia-noite, próxima parada: o Si Bemol na Alameda
Cabral. A escada de madeira estreita de acesso ao piso superior sofria para dar
conta do movimento. Ver e ouvir o Lápis cantar tinha seus encantos e compensava
qualquer sacrifício, inclusive o de esperar mais de hora para conseguir um cuba-libre.
Um tal de Paulo Leminski também dava o ar da
graça por lá. Um guardanapo amarrotado e
uma caneta eram suficientes para aquecer a mão fria do poeta. E os versos se
misturavam aos copos e bitucas de cigarros naquele ambiente de luz fraca. Lembro
dos irmãos Péricles e Grego, assíduos frequentadores das noites geladas de
Curitiba.
La Cueva, na Visconde de Nácar. Esse boteco também fazia
parte do circuito dos loucos. O ambiente acolhedor e a boa localização incentivava uma passadela no final da noite. O
som gostoso do Bob Dylan numa altura
mediana deixava a cabeça insana e ao mesmo tempo mais leve do que se previa. La
Cueva teve vida curta. Depois de fechar as portas, o espaço abrigou uma boate
de strip tease.
Quase 5 da matina. Garçons cansados e cadeiras em cima das
mesas. Vontade de comer antes que a dia
amanheça. Bora pro Bar e Restaurante do Luiz na José Loureiro, especialista em
servir sopa na madrugada aos desvairados. Prostitutas, taxistas, um ou outro
travesti, convergidos num mesmo ambiente e unidos por apenas um objetivo: saciar
a fome. É a fome humana, sem preconceito ou distinção de classe.
Si bemol Alameda Cabral, onde conheci e tocamos junto nosso saudoso Ivo do Blindagem, ele com os rocks e eu com sambinhas acompanhados pela Tininha com seu tabaque e vassourinha. Onde andará?
ResponderExcluirWander Machado
ResponderExcluirMeu pai foi dono do si bemol!!!
ResponderExcluirOs donos da Velha Adega foram os meus pais, dona Mariana e seu Emílio. O nome da garçonete era Dora. Que tempo bom 👍🏻👏🏻🙋🏻♀️
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